quarta-feira, 21 de julho de 2010

Purificação


Uma lágrima cai.
E eu já não posso conter todos esses anos de reclusão.
A solidão deixou algumas marcas. As feridas cicatrizam de acordo com aquele meu tempo perdido. Mas o sangue ainda escorre. E preenche os espaços destinados à ilusão.
A dor de ser único é privilégio de quem a sente.
A felicidade nesse ser é tão merecida e desfrutada como fruta colhida no pé.
Eu acredito que aquele meu refúgio tenha sido descoberto por mentes oprimidas.
A minha sala não é mais cor-de-rosa. É de madeira. A lareira continua acesa. E mesmo que eu queria, os pertences não somem em um piscar de olhos. Essas recordações sabem do seu espaço e teimam em permanecer. Discutem comigo os seus benefícios. Ainda que eu acenda a luz e enxergue tudo verde claro e uma cama branca com os pés para a janela. Esse não é o verdadeiro lugar.
O cinza que impregna a alma dá as caras como a chuva na cidade grande.
O ar que entra pelos meus pulmões é mais azul. Mas ainda contém carbono.
E o livro da cabeceira...
está aberto na página duzentos e vinte e três.
Eu reflito.
Eu acordo e a cortina continua aberta. A janela fechada. E um jardim do lado de lá.
A secretária fala inglês.
O poeta, francês. E eu, com o meu português, fico sem saber para aonde ir.
Onde estou?
E uma campainha toca. É o aviso que a prova de roupas é a seguir.
Um espanhol, sem saber de tudo em mim,
sobre mim,
e que não lê minha mente,
abre um guarda-roupa.
E me sugere
um blazer.

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